LUGAR E CIRCUNSTÂNCIA DO ESCRITOR- Cyro de Mattos

Ser escritor é profissão ou apenas uma atividade dos que exercem a arte literária? Thomas Mann afirma que não é profissão alguma, e, sim, uma maldição. Começa terrivelmente, muito cedo. O criador de A Montanha Mágica (Editora Globo, 1953) quis dizer com isso que o autor ao ser impelido pela força do destino para se manifestar sobre a vida carrega todo o peso terrestre dentro de si, suportando assim inúmeras situações conflitantes do existir nos ermos de seu calvário. Quando faz a leitura crítica do mundo, toma de empréstimo ao sonho a palavra com a sua natureza mítica. De onde vêm, para onde vão nessas antenas da raça tantos sentimentos e tendenciosas explicações?
Há quem afirme que a literatura ajuda a viver o sofrimento que todos nós temos na vida. Carlos Drummond de Andrade acha que ela ajuda esse sofrimento ser um jogo divertido. O trivial lírico de Itabira afirmou que é escritor porque escreve. Ele nunca quis ser membro da Academia Brasileira de Letras, apesar das insistências, mas nunca abdicou da sua função de escritor, de alguém simples que gostava de falar como pássaro do cotidiano nos eventos da vida. Nunca lhe agradou essa maneira solene de ser diferente, não dava sentido à nossa incompletude, que gera incertezas e dramas diante das questões profundas.
Não é exagero achar que a literatura é uma profissão. É condição, ato ou efeito de professar, perseguir, proferir crenças e valores. Declarar publicamente ao outro o que somos no mundo. Nela confessamos nossa opinião sobre seres e coisas porque assim é nosso modo de ser-estar na existência. Profissão que não dá rendimentos para sobreviver, não devia ser assim, dado que é forma de conhecimento da vida, transmite ensinamentos fundamentais como o amanhecer. Exige esforço e labor. Sacrifício, doação.
Não se vive de literatura, mas para a literatura, dentro dessa condição em que o autor procura liberar desejos e medos das zonas da razão e emoção. Essa é minha crença, tem sido minha paixão. A literatura vem demonstrando que gosta de mim, nesse meu jeito de respirar no trânsito da vida, assumir as afirmações e suportar as negações. É minha maneira de me sentir útil na vida quando simulo a realidade através da metamorfose da palavra e levo minha experiência do mundo aos outros.
A literatura organiza meus conflitos, oferta-me sonhos, equilibra-me no difícil gesto de viver, que, segundo Guimarães Rosa, é muito perigoso. Nesse espaço vital da criação literária é que me encontro com as mentiras de verdade fornecidas na solidão solidária, deixo de ser um cadáver ambulante que procria. Convenço-me de que sou apenas esse pobre homem, contraditório, finito, provisório, andante e errante com suas ingenuidades e dramas, nesse momento intervalar entre o primeiro vagido e o último suspiro. Sem fazer a prosa de ficção ou o poema não sou um ente que pensa e tem emoção. Não tenho motivações para fazer leituras do mundo com as vestes da vida e da morte. Não consigo retirar dos dias personagens que se queimam com suas dúvidas, choram às escondidas, revelam suas incandescentes ternuras na parte noturna do ser.
A certa altura da entrevista que dava para alguns jornalistas, o romancista William Faulkner comentou sobre a alegria que tinha no ato de escrever. Ele disse: “Porém criar! Qual dentre vós, não tendo em si este fogo, pode conhecer esta alegria, por mais fugaz que ela seja?” Para o autor de O Som e a Fúria (Editora Portugália, Lisboa, 1969), o legítimo escritor é capaz de saber o que é esse fogo fugaz da ilusão. Sem essa alquimia do verbo no romance ou no conto não há o beijo, a lágrima, o riso, o epitáfio, a busca do sentido da tragédia que somos no mundo como seres imperfeitos.
É com esse fogo da ilusão, a que se referiu William Faulkner, que aceno para as coisas da vida que se foi, justamente me aconteço nesses versos do poema “A Roda do Tempo”:

Criei vaga-lumes
Para vê-los à noite
Brilhando no quarto.

Nadei como um peixe ágil
Nas águas mais claras
Do Rio de Água Doce.

Como um pássaro
Tive cada voo
Com o vento mais alto.

Andei como bicho solto
Sem ter medo de nada
Pelas ruas do mato.

Mas a infância tem o sabor
De uma fruta doce que termina

Não é fácil caminhar nessa estrada das letras, a essa altura comprida. Há os que dizem que o escritor tem fome de fama quando escreve, quer permanecer para sempre nos outros com os seus sentimentos e com isso alcançar a imortalidade. São argumentos pueris de quem não tem humildade para reconhecer a obra valorosa que o autor conseguiu durante décadas. Não sabe que o autor legítimo no ato de exercer a palavra escrita tenta encontrar-se por entre os rumores de navegações agudas. Não sabe de solidões pessoais e imaginadas na madrugada de um homem entre alegre e triste.
Jorge Luís Borges declara que escreve para viver. Gabriel Garcia Márquez afirma que morre se não escrever, mas também morre se escrever. Escreve-se porque assim devia ser. Fica claro que escrevo não com sede de imortalidade. E que sei do meu tamanho e do lugar que ocupo no meio dos outros. No fundo de tudo, bom não esquecer, nós somos iguais, entre nascer, viver e morrer. Cada um está aqui para contar a sua história. Como o vento, não ficamos, para isso fomos feitos, sonhamos e passamos.
Nada se pode fazer diante do inexorável fixado pelo tempo, esse senhor categórico, que tudo dá e toma, não muda, nós é que mudamos. Ai de mim, ai de mim. Então lembro, no instante em que termino esse texto sobre o fazer literário, o que eu disse certa vez nos dois últimos versos de um soneto:

Da cabeceira para a foz
Tantas explicações
Para saber enfim
Que nada sei de mim.

Por isso escrevo para ser testemunho de meu tempo, sabendo que não vou mudar o mundo.

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A ALITA parabeniza os 4 candidatos eleitos em 2023 para fazer parte do seu quadro.

Breve currículo dos candidatos eleitos:

 

 

GUSTAVO CUNHA CARVALHO
Autor do livro Chácara das Tormentas
Graduação: Medicina, pela Escola de Medicina e Saúde Pública ( Escola Baiana de Medicina ) BA
Especialista em infectologia
Membro titular da Sociedade Brasileira de Infectologia
Pós Graduação em Saúde Pública pela Universidade de Ribeirão Preto ( SP )
Presidente da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Regional Costa do Cacau
Médico Referência em IST/AIDS e do núcleo de infectologia do município de Ilhéus
Membro ocupante da cadeira de número 5 da Academia de Letras de Ilhéus.
Autor de poesias publicadas nas edições da revista da Academia de Letras de Ilhéus

 

 

RAFAEL GAMA
Professor, Poeta, Produtor Cultural e Apresentador dos Programas Essa Gente Grapiúna e Via Litterarum Encontros em Prosa e Versos na TVi
Licenciado em Geografia e Mestre em Educação (UESC), Doutorando em Geografia Humana (USP)

 

 

SERGIO SEPÚLVEDA
Cantor, compositor, diretor de eventos e comunicador do programa Surya talk show
Com 03 músicas autorais
Nos CDs jupará
01 CD solo intitulado “tanto faz”
01 CD solo tanto voei pra encontrar você
01 single Maria Joana
São 41 anos de carreira
Passeando pela música erudita ao popular.

 

ELIABE IZABEL DE MORAES

Mestre em Educação

Formação Profissional:

Curso de Magistério – 1966 – Colégio Divina Providência.

Graduação em Estudos Sociais – (História, Geografia, OSPB, EMC – 1970 – Faculdade de Filosofia de Itabuna.

Graduação em Pedagogia e Supervisão Escolar – 1986 – FESPI.

Pós-Graduação em Política Educacional – 1994 – PUC – Minas Gerais.

Mestrado em Inovação Pedagógica – 2008 – Universidade Pública da Madeira.

Vínculo Institucional:

Professora em Itaju do Colônia – 1967 – 1968

Escola Pio XII – 1969 até os dias atuais – Diretora, professor de geografia;

Secretaria do Estado da Bahia – 1970 – 1995 – Coordenadora Pedagógica;

Conselho Municipal de Educação 2002, reeleita em 2005.

Colaboração de textos e livros:

Editorial do Jornal Tribuna do Saber nas 32 edições;

Sexualidade na adolescência: A convivência de conflitos e a interferência na aprendizagem Escolar – Abril de 2008

50 anos – Fazendo lindas histórias sempre.

Escrevendo – 19 de junho de 2021 – marcou a minha vida.

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WALKER LUNA – Rilvan Santana

Nunca é demais repetir a frase de William Shakespeare: “Existem mais coisas entre o céu e a terra do que pode supor nossa fã filosofia…”, para justificar o caminho que me levou ingressar na Academia de Letras de Itabuna – ALITA, com o título acadêmico de membro fundador efetivo, sob a égide patronal de Walker Luna. Far-se-á necessário dizer, a priori, antes mesmo de traçar o caminho que percorri até ALITA e discorrer sobre Walker Luna, que nunca persegui tamanha honraria e não tenho mérito para merecê-la, mas o título me foi concedido por um conjunto de circunstâncias alheias à minha vontade e a generosidade intelectual e grandeza moral de homens da terra do cacau.
Embora apaixonado pela leitura e escrita desde jovem, não sou escritor no sentido lato do termo, um profissional da palavra, um mestre da criatividade da prosa e do verso, um artista da expressão e da forma, mas um escrevinhador de poucos recursos linguísticos e literários, sem talento criativo, sem conhecimento científico ou técnico, mais um aprendiz e um autodidata, que pouco sabe usar a estética da palavra e o conhecimento da ciência.
Aprendi gostar de literatura desde cedo nas feiras-livre com os cantores de cordel. Qual o garoto de passado distante que nunca parou numa praça para ouvir um trovador cantar sua história de trancoso?… Eram contos da carochinha, histórias de príncipes desalmados e princesas socorridas por um herói surgido do nada; reis tiranos e rainhas submissas; bruxas malvadas e homens virando lobisomens, cangaceiros e volantes, padres e mula-sem-cabeça, etc.
Porém, foi na juventude, no colégio, que tomei conhecimento das diversas escolas literárias e seus principais escritores. Como todo estudante, li an passant a literatura portuguesa com Camões, Eça de Queirós, Gil Vicente, Castilho e Fernando Pessoa e os seus heterônimos, Alberto Caieiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos e na literatura brasileira li Gregório de Matos, Cláudio Manuel da Costa, padre Antônio Vieira, Gonçalves de Magalhães, Fagundes Varela, Álvares de Azevedo, Castro Alves, Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar e o meu conterrâneo Tobias Barreto, porém, não tomei muito gosto pelos escritores e poetas românticos e do arcadismo, com exceção de Castro Alves e José de Alencar, Gregório de Matos e padre Vieira, mas me amarrei com os escritores e poetas do realismo e a literatura moderna e a literatura contemporânea, que tecerei alguns comentários, a posteriori, de obras e autores.
Conheci a obra de Machado de Assis pelo fim e não pelo começo, isto é, pelo realismo e não pelo romantismo, ao invés de ler Helena, Ressurreição, Crisálidas e Falenas, comecei por Memórias Póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro. Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, intrigou-me e deixou-me chocado o recurso mórbido de um morto contar sua própria história, desde o introdutório presságio, diferente, por isto, peço-lhe licença meu querido leitor, para transcrevê-lo, sem acrescentar nem tirar:
Capítulo I – Óbito do Autor
Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo; diferença radical entre este livro e o Pentateuco. Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia -peneirava- uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu à beira de minha cova: -«Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que tem honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado.» Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego, como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez pessoas, entre elas três senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, -a filha, um lírio-do-vale, – e… Tenham paciência! daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora. Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática… Um solteirão que expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementos de uma tragédia. E dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia crer na minha extinção. -Morto! morto! dizia consigo. É a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, -a imaginação dessa senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil… Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos. Agora, quero morrer tranquilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro. Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma. Morri de uma pneumonia; mas se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma ideia grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo.
Achei uma ideia ousada, um método diferente, naquela época, nunca havia lido nada igual, somente muito tempo mais tarde, li “A morte e a morte de Quincas Berro D´Água” de Jorge Amado, um romance mais ou menos parecido na morbidez, mas se em Machado de Assis, o morto conta sua vida e sua morte; no livro de Jorge Amado, toda pantomima é feita pelos amigos de Quincas Berro D´Água, que morre duas vezes, uma no fundo do mar.
Outro livro que me impressionou e me arriscaria tecer alguns comentários, é Dom Casmurro, a começar pela escolha do título, onde o autor se confunde com o personagem, pois se Bento Fernandes Santiago tornou-se um misantropo, Joaquim Maria Machado de Assis não deixava por menos: – mãe doméstica, neto de escravo alforriado, pai operário, mulato, epilético, gago, criado pela madrasta no morro do Livramento vendendo cocada nas escolas, aprendeu francês, inglês e latim por sua conta e risco, depois de adulto, tornou-se arredio, quase antissocial.
A trama de Dom Casmurro é uma trama comum com ingredientes de amor, amizade, traição e vingança – Bentinho deixa Capitu morrer esquecida num país da Europa e cria condições para que seu filho bastardo Ezequiel morresse lá fora, numa expedição científica no Egito -, porém, os traços psicológicos dos personagens são tão fortes, o enredo tão bem articulado, a linguagem fácil, não rebuscada, quase cotidiana, que é difícil não considerar o “Bruxo de Cosme Velho” de Drummond, o maior escritor brasileiro de todos os tempos.
Frases significativas definem a personalidade dos principais personagens de Dom Casmurro: “olhos de cigana, oblíqua e dissimulada”, “olhos de ressaca”, “tio Cosme tinha escritório na antiga Rua das Violas, perto do júri… trabalhava no crime”, “José Dias, agregado da família, amava os superlativos, as cortesias que fizesse, vinham antes do cálculo do que da índole”, “prima Justina vivia conosco por favor de minha mãe”, “ a mãe de Capitu, era alta, forte, cheia, como a filha, a mesma cabeça, os mesmos olhos claros”, “Escobar, era um rapaz esbelto, olhos claros, um pouco fugitivos, como as mãos… como tudo” e “Filho de Capitu e Bentinho. Tem o primeiro nome de Escobar. Imitava as pessoas. Vai para Europa com a mãe, estudou antropologia e mais tarde volta ao Brasil para rever o pai. Morre num país da África de febre tifoide.”
Li, afora os autores portugueses, alguns escritores estrangeiros: Kafka, Hemingway, Sidney Sheldon, Morris West, Harold Robbins, Fiódor Dostoiévski, Allan Poe, Saint-Exupéry e outros, que a memória no momento me trai, todavia, nenhum desses autores, é maior do que Machado de Assis, Euclides da Cunha, Monteiro Lobato, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, José Lins do Rego, Drummond, Manuel Bandeira, Jorge Amado etc., etc.
Faz-se necessário esclarecer que a inserção de escolas literárias e autores, nos parágrafos anteriores, antes de definir a minha trajetória até ALITA e a escolha do meu patrono, Walker Luna, não foi para esnobar conhecimento, mas teve o objetivo de demonstrar a minha fragilidade no saber literário, embora seja um leitor contumaz, leio por prazer, não por obrigação de adquirir conhecimento, não sou um experto do assunto do ponto de vista formal e um letrado de relevância.
Uma semana ou duas semanas antes da fundação da Academia de Letras de Itabuna – ALITA, em 19 de abril de 2011, a minha esposa recebeu um telefonema do ilustre juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Itabuna, Marcos Bandeira, que desejava falar comigo. Diz a sabedoria popular: “Quem não deve não teme”, porém, recado de autoridade da justiça ou da polícia, que não é de sua intimidade, mesmo que não deva, fica um bichinho cutucando sua mente.
Não o conhecia pessoalmente, não sabia se era gordo ou magro, baixo ou alto, preto ou branco, se era cordato ou arrogante, apenas, o conhecia de nome por ouvir dizer e de algumas notícias de jornal, notadamente, da Vara da Infância e Juventude itabunense, porém, dois ou três dias depois do recado de minha esposa, soube o verdadeiro motivo do ilustre magistrado: a fundação de uma academia de letras.
Encontramos-nos em seu gabinete de trabalho pouco tempo depois. Fui acompanhado de minha filha, como se tratava de cultura, da fundação duma academia de letras, presenteei-lhe com dois livros de minha autoria e marcamos nos encontrar com os futuros membros na Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania – FICC. Tive uma boa impressão do magistrado em nosso primeiro encontro. Notei que não se tratava dum pedante, dum presunçoso da função, mas um humanista de grande saber jurídico e antenado com o mundo.
Aprendi com o saudoso professor Jorge Visca, no curso de psicopedagogia, que uma das dificuldades de aprendizagem é o medo do novo. Jamais faltei em 32 anos no exercício do magistério, um dia de aula, era o primeiro que chegava e o último que deixava a escola, porém, em 19 de abril de 2011, eu fui o último a chegar à FICC. Acho que estava com medo do novo, com medo das novas circunstâncias, da ideia de contribuir para fundação de uma academia de letras, principalmente, com medo de tornar-me membro de uma confraria de intelectuais de escol e fazer feio.
Com exceção do professor e babalorixá Ruy Póvoas e da professora Dinalva Melo, conhecidos de priscas eras, do tempo da FAFI e do juiz Marcos Bandeira que o tinha conhecido recente, não conhecia mais ninguém no dia de fundação da ALITA. A diretoria da academia foi rapidamente definida e como presidente da academia, Dr. Marcos Bandeira e na vice-presidência, a juíza aposentada Dra. Sônia Maron. Os patronos e cadeiras vieram a seguir, por ordem alfabética, fui designado para cadeira nº. 09, e, escolhi para patrono: Joaquim Maria Machado de Assis.
Mas, na reunião subsequente, ainda no processo de arrumação dos membros efetivos e suplentes, um diálogo subjacente entre o presidente da ALITA Marcos Bandeira e o diretor de biblioteca, o escritor Cyro de Mattos, me chamou a atenção:
– Ele aceitou?
-Sim, mas com uma condição…
-Qual a condição!?
-Machado de Assis como patrono!
-Mas… Machado… já foi escolhido… – o presidente embaraçado…
A conversa foi destrinchada logo depois, é que o jornalista e escritor Hélio Pólvora só aceitaria ser membro efetivo da novata academia de letras itabunense se o seu patrono fosse Machado de Assis. Não deixei que a conversa se estendesse, incontinenti, abri mão do patrono que eu escolhi, não quis ser empecilho, quedei-me diante do prestígio intelectual do escritor Hélio Pólvora, que além de itabunense, é membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), da Academia de Letras da Bahia (ALB), e da Academia de Letras de Ilhéus (ALI), e, publicado em vários países estrangeiros, aí, fiquei na casa do sem jeito, o jeito foi ficar com Walker Luna.
Nunca havia lido uma linha sobre Walker Luna, não conhecia sua obra, não sabia se ele era autor de prosa ou poesia, ou, ambos, eu não sabia se ele havia nascido na Bahia, no Pará, ou, na Cochinchina, mas não manifestei a minha ignorância aos demais confrades, resignei-me com o ensinamento de Paulo Freire: “Ninguém ignora tudo, ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa, todos nós ignoramos alguma coisa”. Voltei para casa e consultei o “Google”, o pai dos burros e não o “Aurélio”, mas não encontrei nada ou quase nada de Walker Luna, agora, meu patrono.
Recorri aos amigos, Antônio Lopes e Eglê, eles enviaram por e-mail algum material, porém, incipiente para o resumo biográfico do patrono, um mês depois, recebi um e-mail do filho de Walker Luna, através do presidente Marcos Bandeira, parabenizando-me pela homenagem que tinha prestado ao seu pai, com a promessa de disponibilizar o material necessário para se elaborar uma descrição mais completa e colocá-la no quadro de patrono, infelizmente, foi tudo.
Walker Luna escreveu pouco, a exemplo de Castro Alves, Álvares de Azevedo, Firmino Rocha, Valdelice Pinheiro e Helena Borborema. Os seus livros: Esses seres de mim (1969), Companheiro (1979), Estação dos pés (1983) e Um ângulo entre montanhas (1985), são no dizer de Telmo Padilha: “… de elaboradíssima tessitura, são personalíssimos e possuem uma ductilidade rara entre os seus companheiros”.
Homem arredio, antissocial, sofrido, se preocupava mais com a qualidade de sua poesia do que quantidade de editoração, ele mereceu de Assis Brasil e de seu conterrâneo Cyro de Mattos, sinceros elogios, para Cyro de Mattos, a poesia de Walker Luna “possui homogeneidade temática e formal, seus poemas interligam-se por um fio narrativo, um complementando o outro, atingindo níveis vertiginosos, compartilhando perplexidade, angústias, emoção que vibra o ontem e o hoje em sua dicção solitárias, ao mesmo tempo em que mistifica imagens.”
Nascido em Itabuna, em 6 de agosto de 1925, começou o curso primário com Dona Etelvina de Andrade e o terminou no Colégio Belfor Saraiva, aos 14 anos, mudou-se para Salvador e concluiu o curso secundário na colégio do professor Hugo Baltazar. Conta-se que não fez curso superior e aos 19 anos radicou-se no Rio de Janeiro, onde começou publicar suas poesias.
Não obstante a escassez de referências bibliográficas do poeta itabunense, sua falta de raízes da região do cacau, faz-se necessário transcrever (abaixo), na íntegra, o seu poema “A cidade Perdida”, extraída do livro: “Um ângulo entre montanhas, ano 1985”, quando o poeta retorna para sua terra natal.

A CIDADE PERDIDA
Walker Luna

Minha cidade estendeu-se
Alargou suas redondezas
Multiplicada em distância
Insatisfeita
Subiu
Buscando mais horizontes
e perdeu-se dentro dela.
Volto hoje a procurá-la.
Transfiguraram-se os jardins
E os encantos do seu rio
Tomaram novas feições.
Até o céu era outro,
ou eram outros os meus olhos?
Sob a ação de tanto tempo
Anoiteceu em si mesma
E confundiu seus vestígios
Entre as formas
De mais gritos.
Agora
É só pensamento
– minha cidade de outrora.

Além de correção de técnica e forma, o poeta expressa sensibilidade nostálgica, não reconhece mais a cidade pura de outrora, que nasceu e viveu parte de sua adolescência. Agora, atingida pelos fumos de desenvolvimento e progresso: “Insatisfeita subiu”. As imagens do passado não são mais as mesmas… O rio, o céu e os jardins perderam os seus encantos ou foi ele que perdeu o encanto do olhar. Hoje, a cidade só pensa em crescer e tudo ocorreu sob a ação inflexível do tempo, então, o poeta descobre que a Itabuna de outrora não mais existe: ”É só pensamento, minha cidade de outrora”.
Hoje, estou convencido que Walker Luna alçou vôos tão alto na poesia quanto Machado de Assis na prosa, por isto, eu o aceitei como meu patrono!…

Autor: Rilvan Batista de Santana
Itabuna, 26 de novembro de 2012.

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Homologação do resultado da eleição para novos membros da Academia de Letras de Itabuna- ALITA

Após averiguação e apuração dos votos e dos votantes, membros da Academia de Letras de Itabuna, a comissão encaminhou seu parecer com o resultado da eleição para os novos membros da instituição.

Para a cadeira 19, destinada a candidatos residentes em outras cidades, foi eleito o candidato Gustavo Cunha Carvalho.

Para as cadeiras 3, 10 e 27, destinada a candidatos residentes em Itabuna, foram eleitos os candidatos Rafael Gama, Eliabe Izabel e Sergio Sepúlveda.

O resultado desta eleição foi homologado em 22 de setembro de 2023.

 Wilson Caitano

Presidente

Documento:

Homologação do Resultado Eleicoes Novos Membros 2023

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Roda de Leitura Sônia Maron aconteceu na Escola Lúcia Oliveira

Uma tarde de histórias, poesias e sorrisos.

 

A Academia de letras de Itabuna realizou, na sexta-feira, dia 25 de agosto de 2023, mais uma RODA DE LEITURA SÔNIA MARON. O encontro aconteceu na escola municipal Lúcia Oliveira. Estiveram presentes: a primeira secretária, Lurdes Bertol;  a segunda tesoureira, Sione Porto, o diretor da revista Guriatã, Charles Sá e a diretora de Comunicação, Raquel Rocha.

O grupo de alitanos foi recebido pelas coordenadoras Caroline Macedo Cavalcante Nicácio e Antonia Maria Alcântara Brito.

A Roda começou com a coordenadora do projeto, Raquel Rocha, perguntando às crianças se eles sabiam o que era uma Academia de Letras. Após explicar o que era e sua finalidade, os membros foram apresentados.

Na sequência os alitanos realizaram leituras de autores regionais e clássicos da literatura mundial. Lurdes Bertol leu Jardim Encantado de Fátima Gondim, Sione Porto contou a história da Cinderela e Charles Sá leu o Cão e o Osso, fábulas de La Fontaine  Os alunos ouviram as histórias contadas pelos alitanos, atentamente e a alitana Raquel Rocha finalizou as leituras com as charadas do seu livro “Responda certo se for esperto”, do escritor Cyro de Mattos.

Registramos nossos agradecimentos à diretora Jaimária Souza dos Reis e à vice diretora Mariene Araújo Santos, pelo acolhimento carinhoso.

 

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DE PRIMEIRO FOI O ABECÊ-  Cyro de Mattos

         Sem esconder uma certa alegria na voz, a mãe disse:

– Segunda-feira você vai aprender o abecê na Escola Montepio dos Artistas.

       Ela finalizou dizendo que primeiro o menino aprende o abecê, que são as letras do alfabeto. Depois vai começar a soletrar as palavras para aos poucos aprender a ler o nome das coisas.

         Na pequena pasta de couro havia sido guardado o abecê, o caderno de caligrafia, outro para os primeiros exercícios de aritmética, um lápis, uma caneta esferográfica, uma caixa de lápis de cor e uma borracha. A merenda, pão com queijo, fora embrulhada com papel brilhante comprado na livraria. Foi posta na sacolinha com a garrafa plástica contendo o suco de uva.

          A mãe disse que todos os dias que fosse à escola ia levar a pasta de couro com os objetos escolares e a merenda escolar.  Além disso levaria também a sacolinha com a garrafa de plástico contendo o suco de uva, uns palitos e dois guardanapos de papel.

           As aulas começavam às 8 horas e encerravam às 11, 30. Havia um intervalo de meia hora para os alunos merendarem no pátio da escola. Acontecia às 10 horas.

          Entre assustado e receoso tentou se aproximar daquele grupo de meninos da sua mesma idade, talvez cada um com seis anos. Sentou em uma das carteiras que formavam a primeira fileira no salão grande, ventilado e iluminado. No primeiro dia não quis ficar sozinho. Começou a chorar quando ouviu a mãe dizer para ele que viria buscá-lo perto de 11,30 horas quando então voltaria com ela para casa. Pensou inconformado, era muito tempo ficar à espera que a manhã passasse até que a mãe viesse buscá-lo na escola quando encerrasse o dia de aula para os alunos das primeiras lições escolares.  Abriu a boca no berreiro quando viu a mãe saindo pelo corredor para deixar a escola pela porta larga da entrada. Todos ficaram assustados com o berreiro dele, nunca havia acontecido isso antes. A professora pediu que a mãe ficasse aqueles primeiros dias com o filho na escola até que ele se acostumasse com os novos colegas num ambiente que lhe era estranho, estava conhecendo pela primeira vez.

           Ela só ficou com ele apenas nos dois primeiros dias.  Fez logo novos amigos nos últimos dias da primeira semana de aula, entre os meninos do seu tamanho.  Se esforçou para aprender o abecê o mais depressa. Aprendeu em boa hora a soletrar os nomes. Não precisava dizer o quanto sorriu de contente quando começou a soletrar um bocado de palavras, que a professora ia soletrando, repetindo com paciência, uma a uma.

            Na primeira vez em que foi ler um texto pequeno, que falava do amanhecer numa fazenda, não gaguejou. Foi seguro e rápido. Arrancou aplausos dos colegas.  Em casa contou à mãe que já estava começando a aprender a ler. Era uma questão de tempo agora para folhear o almanaque do Biotônico Fontoura ou até mesmo o jornal diário. E então começasse a saber o que acontecia na cidade, já pensando um dia em conversar com o pai sobre o fato que mais lhe chamasse atenção.

            Tempos depois pensaria que se não fosse o abecê jamais se tornaria um leitor desejoso de saber mais acerca da vida, cujos movimentos se manifestavam com o seu modo continuado de acontecer por entre os seres humanos, em cada dia.

           Nem saberia, nos seus detalhes, da importância das coisas criadas por Deus para que existisse o reino perfeito da natureza, com o sol e a chuva, a claridade e a noite, a nuvem e a árvore, o peixe e a água, o pássaro e o canto, enfim, o pai com o trabalho e a mãe como a companheira na construção de uma família com bases no amor e honradez.

 

 

DE PRIMEIRO FOI O ABECÊ-  Cyro de Mattos Read More »