Poemas de Cyro de Mattos

EM LOUVOR DE NOSSA SENHORA DA VITÓRIA

Cyro de Mattos

 

Tocai, sinos, tocai

na primeira vitória

de uma senhora santa

contra o bugre feroz

ferindo sangue ilhéu

por mais de uma cilada.

 

Tocai, sinos, tocai

na segunda vitória

de uma coragem santa

do heroico Catuçadas

contra ávido francês

e suas naves armadas.

 

Tocai, sinos, tocai

na terceira vitória

de uma guardiã santa

que sofridos ais ouve

e para longe da ilha

expulsa flamenga faca.

 

Tocai, sinos, tocai

enquanto houver na praça

uma noite de emboscada,

eis que no outeiro moram

a fé, a luz, a espada

da santa da vitória.

***********************

 

POEMAZUL DE ILHÉUS

Cyro de Mattos

 

 

Deuses empurraram líquidas vastidões

por te querer verde no seio da enseada,

flor conclusa, marinheiro território,

léguas de promissão ouro vegetal sendo

 

falam sombras de casarões antigos,

vozes ausentes em água, céu e chão,

velhas armaduras domando geometria,

em gestos de outrora urdidas solidões

 

navega meu barco em teus mares

luminosos de balanço pela praia,

ao vento triunfavam jubas brancas

de turmalinas e esmeraldas a ciranda

 

no marujo guerreando mil piratas

sobretudo sem dunas nem salsugem

entre Barra de Itaipe e Olivença

simplesmente o azul de rica fábula

 

desenhando nuvens nos meus olhos

caju, coco mole, fruta-pão, manga

nesse mar estava o sabor do infinito

no alcance com peixes multicores

 

anoitecida de azul a cidade repetida,

atabaques repercutem nos oiteiros

evocando teus mistérios africanos,

barra afora vagalume enormemente

 

luas ofertam-me prata pelas ondas,

cantigas de sereia no meu peito,

nos meus olhos piscam águas-marinhas,

flutuam em verde brisa meus cabelos

 

no entanto barco ao largo em avaria,

encalhes não importam nas salinas,

nas espumas busco-te sentimento

de um mundo todo azul em que navego

***********************

 

POEMA DO VIAJANTE E DO TEMPO

                                                            Cyro de Mattos
                                   Fala do viajante:
                                 Tempo não engana tempo
                                  tempo não vai me enganar
                                  tempo ao tempo dá tempo
                                  ao Tempo vai me levar
                                Fala do Tempo:
                              Há um só Deus no tempo
                               cada coisa em seu lugar
                               há Deus em todas as coisas
                               tempo limite sem limiar
                              seja tempo de muitas uvas
                              seja tempo de poucas chuvas
                              seja tempo de amargura
seja tempo de ternura
seja tempo de noivar
há rosas ouro no tempo
há homem céu e mar
há terra lavra de prata
há estrelas a brilhar
sempre tempo que fica
no meu passo passará
onde mente que divaga
onde vaga é navegar
o tempo de vovó Ana
tempo a se mastigar
tempo antigo do pai
tempo de esporas no ar
o tempo de mãe Josefina
o tempo a se magoar
o tempo do irmão infante
tempo a me acompanhar
por que apressar o tempo
se só um é o caminhar?
Tempo ao tempo sem tempo
tempo nesse tempo tumular
teu tempo, tempo de homem,
tempo de pelejar, enfrentar
teu tempo, tempo de sonho
tempo de dar, não tomar
teu tempo, tempo da amada
este tempo como peixe e mar
tempo com tempo no tempo
tempo como ave e ar,
teu tempo de amar-amar
cada coisa tem seu tempo
cada coisa seu lugar,
roda, roda, cavaleiro
tua ronda sem parar
nesse tempo de meu tempo
meu cavalo devagar
teu cavalo aqui está
por que com o tempo brigar?
                            Fala Final do Viajante:
                              Tempo não engana tempo
                              tempo não vai me enganar
                           tempo ao tempo dá tempo
                           ao Tempo vai me levar
                              Adendo do Poeta:
                             assim provisórios somos,
                            contraditórios, ambíguos,
                            cada um no seu canto
                            escrevendo o seu tanto
                            cada sonho idealizamos
                          para no poema ficar
***********************

MINHAS FLORES
Cyro de Mattos

 

A flor de Mariza
Brinca na brisa,
A flor de André
Com a bola no pé,
A flor de Josefina
Como bailarina,
A flor de Adriano
Pousando em Solano.

Suave na brisa
A flor de Mariza,
Alegre no pé
A flor de André,
A dançar na colina
A flor de Josefina.
Na nave do sonho
A flor de Adriano.

Ou essa ou aquela
Quando brilha a sua cor,
Trazem às crianças
Os anúncios do amor.

*Este poema infantil pertence ao livro Tiquinho de Ternura,
que integra a Coleção O Menino Poeta, formada com mais
quatro livros: Existe Bicho Bobo? Poesia de Calça Curta,
Responda Certo, Se For Esperto, A Poesia É Um Mar, Venha
Comigo Navegar, publicação da EDITUS, editora da UESC.

***********************

 

O SABIDO GRILO CRICRILO, IMBATÍVEL NO SALTO E NO TRILO

Cyro de Mattos

Me chamo Cricrilo,
Sou um grilo falante,
Invencível no salto,
O melhor de todos
Quando estou trilando
Em dia inspirado.

Sei que é um risco
Ser de meu tamanho
E viver entre os grandes,
Deus quis assim,
Eu não me queixo.
O que é que adianta
Ser grande por fora
E triste por dentro?

Coisas más que fazem
Com a mãe natureza,
Não consigo entender.
Como o arco-íris
Lamento, fico triste
Quando vejo o rio
Descer sem as águas
Claras de antigamente.
Dói quando vejo
Toda essa judiação
Com o pobre coitado.
Ele não sabe o que fazer
Para limpar a sujeira
Que despejam nele,
Matando seus peixes
De dia e de noite.

(Trechos de um poema infantil, longo,
com os falares de um grilo sábio
e inconformado com as coisas ruins
que fazem com a natureza que nos
cumpre zelar para melhor viver)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *