Boa noite,
Excelentíssimo Presidente da Academia de Letras de Ilhéus, confrade Prof. Josevandro Nascimento, através de quem saúdo os ilustres integrantes desta mesa, as autoridades aqui presentes ou representadas, os confrades, os uesquianos, os amigos; enfim, a todos senhores e senhoras.
Os vagalumes desta noite
iluminam minha noite
e me emprestam
sua luz e suas asas.
Então, feliz,
a estrada clareada,
eu vou te ver.
Valdelice Pinheiro
E aqui estamos, felizes e honrados, Professora Dra. Renée Albagli Nogueira, por recebê-la nesta Casa, onde ocupará a cadeira de nº 32, anteriormente do saudoso e ilustre Prof. Soane Nazaré de Andrade, homem que orientou a vida para a realização do sonho do ensino superior na região e soube distinguir, nas brumas de cada manhã, qual a direção do sol… e andar para lá!
Este é um dos momentos mais ritualísticos e significativos desta Casa de Abel; ato de acolhimento e recepção, enriquecimento da sua confraria; momento de relembrar e dar continuidade à sua própria história. E é uma história que tem buscado, a cada dia, a preservação da memória de Ilhéus. Aqui, é lugar de diálogo, de criação, onde intelectuais das diversas áreas do saber trocam conhecimento e experiências em torno de uma visão ampla da cultura nos seus aspectos literários, artísticos, sociais, educacionais, históricos e das tradições. Aqui, é lugar de convivência respeitosa das diferenças, que fazem a riqueza da multiculturalidade deste país.
Por esses propósitos, é que digo da grande emoção e alegria com que esta confraria, hoje, a recebe, professora. Somos conhecedores do seu idealismo; uma vida dedicada a realização de sonhos e projetos de futuro, voltados para o desenvolvimento educacional, cultural e social desta região.
Assim pensando, tomo os versos de Ricardo Reis, e digo:
Para ser grande, sê inteiro:
nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és
no mínimo que fazes.
Assim, em cada lago,
a lua toda brilha,
porque alta vive.
Assim é! …
Renée Albagli Nogueira é, ilheense, filha de Isaac Albagli e Rosa Chicourel Albagli, nascidos em Izmir, na Turquia. O casal migrou para o Brasil nas primeiras décadas do sec. XX, aqui constituindo a sua família. Casada com Cláudio Nogueira, é mãe de Claudinha, e é avó de Luís Fernando e Isabel. Uma linda família que, neste momento, cumprimento e parabenizo.
Renée Albagli Nogueira é graduada em Biologia, pela Universidade Santa Úrsula, do Rio de Janeiro, com especialização em Genética na Universidade Católica de Minas Gerais e na Unicamp. Fez especialização e mestrado em Gestão Universitária, na Universidade Estácio de Sá, sendo a última etapa na St. Paul University, em Chicago (EUA). Defendeu o Doutorado em Educação, na Universidade Federal da Bahia.
Na Federação das Escolas Superiores de Ilhéus e Itabuna – FESPI, foi professora titular, diretora acadêmica, diretora de graduação e extensão. Em 1996, tornou-se a primeira reitora eleita da Universidade Estadual de Santa Cruz, tendo permanecido no cargo até janeiro de 2004, quando terminou seu segundo mandato. Integrou o Conselho Estadual de Educação (CEE), sendo presidente por dois mandatos e atuando sempre na Câmara de Educação Superior. Após concluir o reitorado na UESC, foi Assessora Especial da Secretaria de Ciência e Tecnologia.
Atualmente, presta assessoria e consultoria na área do Educação Superior. Em reconhecimento à sua brilhante trajetória, tem recebido comendas e honrarias. Dentre outras, aqui destaco o grau de Comendadora, outorgado pelo governador do Estado, em 1998. Recentemente, em 2024, recebeu a medalha Jorge Amado, outorgada pela Academia de Letras de Itabuna.
A sua produção de discursos, pronunciamentos, artigos e relatórios comprovam essa vasta experiência.
Entendemos que a propriedade da Profa Dra. Renée Albagli Nogueira ocupar a cadeira de número 32, desta Academia, é inquestionável, ela que esteve ao lado do Prof. Soane Nazaré de Andrade desde os primórdios do sonho do ensino superior na Região.
A trajetória de luta foi de muitos idealistas, mas foi no seu reitorado, que aconteceu o salto de federação de escolas superiores para universidade!
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma.
Essa primeira estrofe do poema Infante, de Fernando Pessoa, em Mensagem, me remete às trilhas da realização, como foi…“desvendando a espuma”.
E tudo começou em 1974 quando, convidada pelo prof. Soane Nazaré de Andrade, a profa. Renée ingressou na Federação das Escolas Superiores de Ilhéus e Itabuna – FESPI como sua assessora direta, integrando a Comissão de Assessoria e Planejamento – CAP. Aí atuou por dez anos, responsável pelos projetos de novos cursos.
Com a saída do Prof. Soane da direção geral, continuou integrando a administração superior, nos mandatos dos professores Aurélio Farias de Macedo e Altamirando Marques.
Naquele mesmo tempo, a luta de idealistas – professores e estudantes – pela publicização do ensino, não cessava. Afinal, em 5 de novembro de 1991, através de decreto governamental, aconteceu a estadualização, sendo definida a área de atuação da Universidade Estadual de Santa Cruz, abrangendo o Litoral Sul e Extremo Sul do Estado.
No período de transição – reitorado pró-tempore -, foi Vice-Reitora do Prof. Altamirando Marques.
Em 1996, deu-se a eleição para reitor, um ano histórico!. Renée Albagli Nogueira foi eleita a primeira reitora da Universidade Estadual de Santa Cruz, por voto direto da comunidade acadêmica. Foi o início a uma administração que garantiu a consolidação e a expansão da UESC.
Como já dizia Paulo Freire (2000, p. 54), “os sonhos são projetos pelos quais se luta. Sua realização não se verifica facilmente, sem obstáculos. Implica, pelo contrário, avanços, recuos, marchas às vezes demoradas.”
Assim foi.
Claro está que era imprescindível à reitora empossada formar uma equipe que comungasse do mesmo sonho. Então, com a vicereitora Margarida Fahel, formou a sua equipe, cujo foco sempre foi a qualidade, visando à responsabilidade social da Instituição. E foram oito anos na Reitoria na UESC, tempo em que, com garra, visão e valentia, levou a antiga escola de ensino superior ao patamar de universidade.
“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.”
É fato que as marcas de uma trajetória, muitas vezes, ficam pelo caminho. Vão-se apagando com a poeira do tempo. É bem como diz o poeta José Delmo,
Se não vigiarmos a vida,
eles escreverão a história
e o futuro poderá neles acreditar.
Aqui, neste espaço de tempo, difícil será dizer todas as realizações do reitorado da Profa Dra. Renée A Nogueira. De saída, a todos vocês, recomendo a leitura dos vários relatórios das suas duas gestões, do período de 1996 a 2003. No entanto, não posso deixar de, muito rapidamente, referir algumas ações que garantiram a consolidação do projeto universitário.
Inicialmente, na universidade que se instalava, era urgente assegurar a massa crítica imprescindível para o seu credenciamento, pelo Conselho de Educação. Com aquele foco, foram criados o Plano de Capacitação Docente e o Projeto de Absorção de Doutores, que trouxeram competências do Brasil e do exterior para o quadro docente. Simultaneamente, a criação da editora da universidade – a EDITUS – veio assegurar a publicação da produção científica de docentes e discentes.
É também de destacar a significativa ampliação do leque de cursos de graduação e pós-graduação – especializações e mestrados -, nas várias áreas do conhecimento; a instalação de laboratórios para atender às atividades de ensino, pesquisa e extensão; a atenção em relação projetos culturais e de preservação da história.
Tanto a citar, que fica exaustivo, aqui, enumerar… Mas dos muitos cursos implantados na graduação e na pós-graduação, não posso deixar de fazer ressalva ao Curso de graduação em Medicina. É inesquecível a garra com que a reitora ultrapassou os inúmeros obstáculos que se apresentavam. Lembro que, em tempos, o Prof Soane já dizia: “quando Renée quer, saia debaixo…”
E foi mesmo assim… Não esqueço como aquela reitora vislumbrou e teve coragem; lutou arduamente e implantou o curso, tão necessário e desejado pela comunidade.
Claro que, também, teve o olhar atento para as condições físicas do campus. De alguns dos tantos e inúmeros feitos, são exemplos: o Centro de Arte e Cultura, onde funcionam a Biblioteca e um auditório com 1200 lugares, o restaurante universitário, os vários laboratórios… e muito, muito mais…
Vale ressaltar que todo o trabalho desenvolvido naquele período garantiu, em junho de 1999, o credenciamento da UESC pelo Conselho Estadual de Educação, o que assegurou a sua autonomia didático-cientifica.
Naquela época de tamanha luta, eu fazia minhas as palavras de Henfil:
“se não houver frutos, valeu a beleza das flores. Se não
houver flores, valeu a sombra das folhas. Se não houver
folhas, valeu a intenção das sementes” .
Passados tantos anos, Profa Dra Renée Albagli Nogueira, o sentimento é de caminho percorrido, é de colheita dos frutos .
Depois daqueles idos de bota e barro, de plantio e construção, hoje temos um Campus que, conforme justo e certo, chama-se Soane Nazaré de Andrade.
Tenho a alegria de constatar que, àquele pequeno bando de sonhadores que integramos, se somaram outros que têm feito o grupo crescer e ficar mais rico e forte. Plural, como deve ser numa universidade. As árvores, que plantamos um dia, estão belas e frondosas, sombreando bancos, onde estudantes e professores sentam e trocam ideias – prática comum em locais democráticos…
Hoje, quando acompanho a colheita e sinto a sombra das folhas, a beleza das flores e o perfume dos frutos, digo-lhe, intrépida Reitora daquele então: valeu a pena! Valeu a intenção das sementes!!
Para finalizar, considero ainda imprescindível dizer da pessoa humana que é Renée Albagli Nogueira! Integra, ética, respeitadora das diferenças, idealista e pertinaz. Especialmente, a sua solidariedade é singular! E, com muito carinho, revelo que essas atitudes eram, também, como educava Claudinha, que me segredou das suas lembranças quando pequena: ”todos os dias, na hora de estudar, as palavras de ordem eram: responsabilidade, correção, pontualidade, liberdade com respeito!”
Ah… e saibam vocês… não é somente de educação e administração que ela entende, nãooo!! Tenho que revelar que é excelente anfitriã e adora receber com honras e circunstâncias!!
Claro está que essas rápidas referências naturalmente não esgotam o seu perfil e os seus feitos. Mas esta noite, além do lembrado e mencionado, é também para brindes e abraços…
Fato é que, nesse caminhar, querida Renée, amiga de tempos, de sonhos e lutas, aqui chegamos. E digo, tomando as palavras de Mia Couto,
“O que faz andar a estrada? É o sonho.
Enquanto a gente sonhar, a estrada permanecerá viva.
É para isso que servem os caminhos; para nos fazerem
parentes do futuro”
Bem como dizia o seu amigo Ladislau Netto:
“Perseguir sonho é vida que segue”
Acreditando no sonho e vendo em você uma sonhadora contumaz, é que esta Casa de ABEL a recebe e acolhe, certa de que a sua presença aqui será de soma e acrescentamento. Com alegria, portanto, dizemos: Seja bem-vinda!
Maria de Lourdes Netto Simões
Cadeira 19.
Ilhéus, em 11 de julho de 2025.