ADONIAS E JORGE NO JARDIM- Cyro de Mattos

 

No domingo azul de verão fui fazer meu passeio matinal e aproveitar o banho de sol no jardim. Oportunidade em que vejo crianças no ritmo da infância brincando com os pombos, subindo na escadinha da pequena casa e descendo pelo caminho enladeirado feito com a madeira macia. Nessa hora da infância livre como sonho, sorridentes todas elas, com gestos contínuos que se propagam em ondas de alegria e cantares afoitos de passarinho, pelo chão e ar iluminados.
Foi então que tive uma surpresa agradável quando avistei aqueles dois senhores sentados em um dos bancos perto do coreto. Não havia dúvida, eram Adonias Filho e Jorge Amado, os consagrados romancistas, em conversa mansa, fraterna, provavelmente falando das coisas da terra onde nasceram. Das longes terras do sem fim em que uma civilização foi forjada com caracteres próprios graças à saga do cacau, o fruto que valia como ouro.
Aproximei-me deles, dei meu bom dia, disse da alegria em encontrá-los naquele momento marcado pelos céus. Eles sorriram ao mesmo tempo. Adonias foi logo dizendo que se sentia um privilegiado por ter seu nome escolhido para ser o paraninfo da Academia de Letras de Itabuna. Acrescentou que isso era generosidade dos membros da instituição, mas que não fazia justiça ao Jorge, que havia nascido em Itabuna, no distrito de Ferradas, na fazenda Auricídia. Jorge interveio frisando que a homenagem era justa. Disse que embora Adonias tivesse nascido em Itajuípe, antigo Pirangi, distrito de Ilhéus, era antes de tudo um grapiúna, um filho legítimo da civilização do cacau. Afinal, comentou, somos todos irmãos, filhos de uma mesma nação. Ressaltou que se dava como satisfeito em ser o patrono da cadeira 5, que tinha como fundador o escritor Cyro, um de seus autores emergentes preferidos, da geração que veio depois da sua, em terras grapiúnas, com Jorge Medauar, Hélio Pólvora, Elvira Foeppel, Sônia Coutinho, Telmo Padilha, Florisvaldo Mattos e Marcos Santarrita, entre outros.
Não preciso dizer o quanto me senti lisonjeado com a observação de Jorge, mas fiquei com um sorriso tímido, sem graça até, pois não esperava tanta gentileza por parte do célebre autor de Gabriela, Cravo e Canela. Sem dúvida, como o Adonias, Jorge era um autor grandão de nossas letras, eu não passava de um nanico.
Tanto Adonias como Jorge pediram que eu transmitisse aos membros da Academia de Letras de Itabuna (Alita), carinhosamente chamados de alitanos, que estavam sorrindo de contente com uma entidade que se dedicava com competência às letras, ainda na idade de 12 anos. Uma menina moça, mas que vinha fazendo com suas atividades continuas papel de gente grande, desempenho bonito, ao divulgar com amor a cultura.
Despediram-se, depois do fraternal abraço que recebi de cada um deles. Provavelmente iam participar de algum encontro de escritores promovido pelos anjos. Lá, no teatro do céu, atapetado de nuvem no ambiente, acariciado na plateia pelo vento suave, que abana como um leque sem fim os instantes do eterno.

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